
Susana Martinho
Psicóloga Clínica
"Tudo Começa em Casa"
D. W. Winnicot
Pediatra e psicanalista inglês (1896 – 1971)


Já contou hoje uma história?
Contar e ouvir histórias deve ser um momento privilegiado entre os pais e os seus filhos. Não podemos esquecer que é através do padrão de relação precoce entre pais e filhos que se estabelece a forma como nos relacionamos connosco e com o mundo que nos rodeia, as memórias destes momentos são de grande importância, neles moram as fadas, as bruxas, os duendes, os dinossauros, os bons e os maus, criaturas imensas, acima de tudo existe o sonho e a fantasia, a capacidade de viajarmos com as crianças através das páginas de um livro num momento único e mágico. Por isso os pais, que são os principais agentes da saúde emocional dos seus filhos, devem partilhar experiências emocionais de qualidade, estas que são a base para o crescimento de sentimentos primordiais do desenvolvimento infantil. A importância dos finais felizes ou não, permite à criança desenvolver a sua capacidade para encontrar soluções no seu dia a dia com o seu grupo etário e aumenta também a capacidade de resolução de problemas, contribuindo também para a noção de regra e de limites.
Há livros mágicos com histórias e imagens magníficas, que nos transportam para grandes viagens, com uma carga afectiva única, onde os sentimentos de segurança, de pertença e de suporte se edificam nas crianças.
Já contou hoje a sua história aos seus filhos?
A importância da leitura desde o berço
Para falarmos deste tema é importante percebermos todo o envolvimento que ocorre no desenvolvimento de um bebé ainda in útero da sua mãe. Tal como nos diz o Prof. Gomes Pedro, “são as pessoas-pais, são as pessoas, avós que já amam o bebé-feto que são, diria antes, facilitadores de uma arquitetura que se organiza em função de uma vida relacional dominada por emoções, afetos e expetativas”. Desta forma é urgente perceber-se que este bebé já existe e já o sentem ainda dentro da barriga da mãe, já falam para ele, já há inúmeros estudos que provam que em determinada fase o bebé “responde” a estímulos e é aqui que existe para mim um fascínio imenso sobre a disponibilidade dos pais aos primeiros tempos de vida do seu bebé que deveria perdurar para sempre. São um universo de estudos de pesquisa que o hospital pediátrico de Boston possui e vai de encontro à necessidade de uma forte vinculação, o desejo de todos os pais, de uma grande maioria, é de que os seus filhos sejam saudáveis, felizes, que sejam bons alunos e boas pessoas, mas muitos já tem consciência de refletir e pensar sobre o que fazer para que isso suceda. Ler para as crianças, ler aos seus filhos é um ato único, uma atividade baseada na linguagem e nos afetos, são oportunidades que enriquecem não só ao nível cognitivo mas também na relação pais/filhos, a voz, o som dos pais, a sua entoação, a ilustração da página do livro, a cor e a emoção e a própria história eleva-nos para o mundo da fantasia do faz de conta, o mundo fantástico das histórias. Tal como nos diz o pediatra, que revolucionou o formato da pediatria em Portugal no século XX, Dr.Terry Brazelton “ …. A aprendizagem acontece através de relações e interações, a tentativa de pôr a tecnologia ou mais tempo de exercício no lugar da solução de problemas que acontece por via da interação não dá bons resultados, o fator que ajuda as inteligências a desenvolverem-se é a interação humana…” e de forma evidente compartilho desde sempre com este principio que na minha opinião e de muitos outros faz com que os alicerces da primeira infância sejam as estruturas principais onde se estabelecem as bases para todo o desenvolvimento da criança ao nível emocional, cognitivo e da moral. Poderia aqui fazer uma extensão de inúmeros estudos já existentes onde já se observam evidências importantes, gosto particularmente de um (á também evidências de que a idade em que os pais começam a ler para as crianças é importante. Um estudo observacional concluiu que em famílias em que a leitura foi realizada com crianças a partir dos 8 meses, as crianças tiveram um desenvolvimento inicial da linguagem mais robusto (Debaryshe, 1993) que conclui que em famílias em que a leitura foi realizada com crianças a partir dos 8 meses, estas mesmas crianças tiveram um desenvolvimento da linguagem mais eficaz, bem como, traços de vinculação mais fortes, tal como tantos outros existentes. Aspetos de desenvolvimento da linguagem são também importantíssimos e trazem para a criança e para o seu mundo a introdução de novas palavras, com novos significados em que cada dia é uma conquista. Mas sem dúvida o meu maior fascínio neste tema é o da verdadeira importância dos afetos, em que este ato por si só ocupa. Este deveria ser um direito para todas as crianças, especialmente no encerrar da noite, a história contada pelos voz dos seus pais tem um sabor especial, funciona como um colo, um fechar os olhos para o dia seguinte para abrir espaço para o mundo dos sonhos, aqui reside a segurança e a extraordinária capacidade de imprimir neste gesto sem o dizer por palavras: “o quanto gosto de ti é inquantificável”.
“A melhor maneira de tornar as crianças boas, é torná-las felizes.” - Wilde, Oscar